Tuesday, June 27, 2006

É Tribuna ou bisnaga ?


A rotina matinal de Otavio é rígida. De segunda à sexta, acorda às seis e quinze da manhã, toma água banho e café, e segue para a escola. Aos sábados, acorda às sete, toma água, banho e café e vai para escolinha de futebol do batalhão. Nesse dia, quase sempre faz para si um protesto: “pra que tomar banho pra jogar bola”, mas na prática é água, banho e café. No domingo, acorda às oito e meia, toma água, e pega cinco reais com o pai, que lhe pede para comprar a Tribuna, ou uma bisnaga. Seu Geraldo nunca pede as duas coisas. Quando come bisnaga, não lê a Tribuna, se lê o jornal, não come o pão, embora nunca tenha se decidido conscientemente por esse agir.

O problema é que tanto a Tribuna, que é o nome corriqueiro dado ao jornal Tribuna de Minas, quanto a bisnaga, são vendidas no mesmo lugar: bem na esquina da Padre Café com a Cândido Tostes, está a lojinha do Elomir. De nome “Tem de Tudo LTDA”, é para os habitantes do bairro de São Matheus a lojinha. As primeiras três vezes em que Otávio errou, foi por puro azar. Trabalhava sempre com a possibilidade de 50 por cento, e mesmo assim, levou seguidamente tribuna quando o pai lhe pedira para comprar bisnaga, bisnaga quando o pai lhe pedira tribuna, e mais uma vez tribuna no lugar de bisnaga.
Desde então, passou a ficar reticente ao balcão. Chegou a mudar de idéia várias vezes, conjeturado sobre o pedido que lhe haviam feito há não mais de dez minutos. “Quero uma tribuna, quer dizer, uma bisnaga, quer dizer, tribuna bisnaga tribuna”. Com o tempo, o gordo Elomir se sensibilizou, e elaborou junto com Seu Geraldo algumas estratégias preventivas: quase sempre o menino já sai de casa com um papel anotado com uma das duas opções. Quando Seu Geraldo esquece da nota, Elomir não se importa em telefonar para a casa do garoto. Dia desses, com o humor corriqueiro que uma manhã ensolarada de domingo despeja sobre os moradores de cidades pequenas e médias, falou sorridente para Otávio: é Tribuna ou bisnaga? O menino deu a resposta que o pai lhe fizera decorar, para brincar com o vendedor: Não sei Elomir, só sei que é pra levar debaixo do braço.

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